segunda-feira, 2 de abril de 2012

MALDITA BOCA DE GILDA TRAVESTI 1


Essa coisa de estar em Curitiba me deixou com uma pira quando penso em Gilda Travesti... Não deve ser pecado se apossar do mito para extrair dele o mínimo que seja de Arte, mesmo sabendo que por si só a Arte assume o estatus de mito por  encarnar  o pensamento coletivo e estruturar uma forma de a apreender em sua essência mais primitiva. Também não ligo muito para a necessidade  de traduzir Gilda no palco, estou pensando nela como ponto de partida para algo que chegue em um resultado coeso, ou seja, não sei bosta nenhuma do que fazer ainda...rsrsrsrsrsrsrss..
Pelo o que começo a perceber, Gilda aqui em Curitiba é um mito em sua maior força, é um arquétipo-folclórico-urbano-marginal tomado de uma força que pode transmitir tudo em muito pouco... Ela desencadeia medo e diversão em uma população sisuda, quase coronelística, da capital paranaense nos anos 70-80.... Me desculpem mas aqui em Curitiba começaram a investigar os Doces Bárbaros e deram  a letra para a policia de Floripa e Gil foi preso... Onde  um censor queria cortar uma fala do texto de Millôr Fernandes , onde Fernanda Montenegro dizia a oração de Santa Tereza ( detalhe: escrita pela  própria quando em vida e transcrita na peça pelo autor) e o senhor censor achou aquilo extremamente pornográfico e chocante! Uma indecência! Um insulto a moralebomcustumes curitibanas e nacionais!!!! Sem saber ele que  estava ofendendo os dotes artísticos da própria santa... Onde se Leminski não fosse um poquito lijeiro ia passar despercebido por aqui antes de explodir... Onde Dalton Trevisan ainda de esconde do Nelsinho!!!!!!!!!!!!!!! Enfim...  Claro que Gilda se torna um emblema de contravenção ao expor suas verdades e vontades sem se importar com o que as pessoas irão pensar de sua imagem miserável e alegre na Rua das Flores, tormando a boca maldita ao beijar os pedestres que não lhe dessem uns trocados.... Beijos de Judas-mulher , barbada e bêbada, que por incrível que pareça arrancava risos do curitibano... Que a via como louca, logo, inocentemente  feliz em suas faltas.
Gilda está enterrada no Cemitério das Flores  em um túmulo coletivo com mais 18 travestis que, como ela, não tinham onde cair morta! Neste tumulo vi Gilberto Canabarro. Declamar Alvarez de Azevedo, a bichinha loca infectada com o mau do século XIX, de uma forma límpida e comovente em um vídeo no youtube. Ela esta no ranking das 100 mais influentes personalidades gay na radicalização da cultura nacional, em uma lista feita pelo grupo gay da Bahia ... Junto com alvares de Azevedo... Inclusive! Ela foi encontrada morta em sua casa toda doente, iniciando o processo de putrefação que a deixaria ainda mais em pé de igualdade como o emossauro Alvares de Azevedo... Se irmanaram quando foram visitados pelo verme! Ela não consegui comer  a quentinha que uma amiga levou pra ela e como sinal de desprendimento,  deixou no túmulo como se imitasse os antigos faraós e quisesse que Gilda batesse uma larica além túmulo!!! Curitiba ficou sem o escarro da boca que lhe beijou durante anos em  15 de março 1983. Gilda morreu com 32 anos e eu tenho 31! Ela deu a capital um gostinho do que o futuro estava preparando para nós e as vezes acho que isso não foi compreendido ainda por muitas pessoas, gente que nem havia nascido quando Gilda se foi e mesmo assim continuam repaginando valores que não cabem mais em nossa dita pós-modernidade...o que diria alvares de Azevedo disso tudo?! Vai saber! Evohé Gilda Travesti de Curitiba

3 comentários:

  1. Interessante, eu era ainda adolescente e me lembro das estórias da Gilda. A morte dela foi amaplamente veiculada nos jornais e televisões da época. Minha mãe trabalhava como Prof.(a) em um colégio da Boca Maldita durante esse período e, por vezes, presenciou as peripécias da Gilda. Era um homem forte e barbudo, que se travestia de mulher, mas ao mesmo tempo dizem ... doce e simpático. Temido, não levava desaforo para casa. A Gilda se transformou em uma espécie de mito aqui em Curitiba. Outro dia, peguei-me rindo ao imaginar a Gilda beijando esses tipos metidos a besta e cheios de pose na Boca Maldita, que, aliás, eram as suas "vítimas" preferidas ...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Eu também fico imaginando o quão desconfortável era para a sociedade curitibana ser "atacada" desse jeito por Gilda... eu não sou de Curitiba e o mito dela chegou até mim quando estava fazendo uma pesquisa de gênero na universidade... fiquei fascinado pela história dela que me pareceu uma espécie de "madame satã" do sul.E quando a ví, através do belissimo documentario "Beijo na boca maldita", de Yanko del Pino, me interessei mais ainda! Aquele ser desprovido de qualquer glamuor, mendigando e ameaçando com um beijo, me encheu de vontade de revirar esse mito e fazer uma leitura dele em cena... estou em faze de pesquisa ainda... e depoimentos como o seu Edson, reforçam o poder desestruturante que Gilda causou e ainda causa... valeu por compartilhar isso!!!

      Excluir
  2. aqui vai o link do documentario pra quem quizer apreciar... http://www.beijonabocamaldita.kit.net/

    ResponderExcluir